O bem contém, o mal está contido

O bem existe, apesar do mal que é apenas um porém, uma ínfima fração contida no bem quase infindável, incomensurável. A farpa que fura um dos dedos, detém a atenção do seu hospedeiro por meio da dor, ainda assim, o restante do seu corpo permanece funcionando, apesar da farpa, apesar da dor, apesar do mal. E este é o cerne da “graça” (favor) divino e da gratidão, porque tudo abaixo do firmamento é assim, abundante bem, limitado mal.

É perfeitamente compreensível alguma resistência a esta realidade, especialmente quando se está com quaisquer tipos de dores, mais especialmente ainda, aquelas da alma. Mesmo assim, o bem é tudo, é o mar que recebe um vazamento de óleo, é o rio puríssimo no qual o banhista pode urinar. O mesmo se aplica ao mal que uma vez nos foi feito, com consentimento (em um relacionamento, por exemplo) ou não (em um estupro, por exemplo) e, em ambos os casos, a gratidão pela oportunidade de superar, de ser maior do que o ocorrido, trata as feridas, aquieta o coração e dá sentido aos próximos passos no processo de individuação que chamamos de vida.

O bem contém, o mal está contido. A partir desta perspectiva, ver o lado bom, apesar do mal, fica bem mais fácil. “Se, porém, os teus olhos forem maus, o teu corpo será tenebroso”, disse o Mestre. Tal entendimento é, na minha opinião, o antídoto às possíveis queixas e murmurações de todo ser humano abençoado que vive neste mundo.

Tudo é amor

Ontem, quando fui dormir, estava deitado sobre o amor, coberto de amor, trancado no amor, adormeci e, quando acordei, meus dois amores se abriram, enquanto eu respirava, calmamente, o amor. Quando levantei, sentado sobre o amor, meus pés também tocaram o amor sobre o qual me levantei para abrir os amores que bloqueavam o amor de entrar. Bebi amor e urinei amor, depois de me lavar com o amor, falei-lhe em secreto, como seu filho, que também é amor, ensinou séculos atrás. Então li o amor, e almocei algumas formas de amor. Pensei amor, senti amor, agradeci e me tornei o que sempre fomos: amor que ama e é amado. Esta é a revelação derradeira: “Pois nele vivemos, nos movimentamos e existimos” (Atos 17:28).

Desunião é morte

Uma idosa conhece a cura para a doença grave daquele vizinho que sequer a cumprimenta. Desunião é morte. Um motorista indignado com a fechada que acabou de levar, se recusa a sinalizar, para os motoristas da mão contrária, um grande perigo após a curva: animais em travessia na estrada. Desunião é morte. Uma tia compartilha informações ignoradas por seu sobrinho que, semanalmente, dirige alcoolizado. Desunião é morte. Várias pessoas de um bairro deixam de denunciar assaltantes à mão armada que estão atuando na sua região. Desunião é morte. Uma mãe, sobrecarregada e tratada sem o devido companheirismo por seu marido, deixa o bebezinho dos dois cair no chão por acidente. Desunião é morte.

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